Mostrando postagens com marcador Bronislaw Kasper Malinowski. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Bronislaw Kasper Malinowski. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 13 de maio de 2016

Considerações sobre o Estado teatro: lições de Clifford Geertz


Existem muitas coisas que me incomodam ao recorrer ao expediente da história da antropologia como se bastasse que ela se convertesse em crítica cultural para que pudesse se desfazer das dificuldades que lhe dão forma. Isto porque, por se tratar de uma atividade científica, e mesmo que não seja necessariamente ciência, a antropologia como fruto de pesquisas de campo é, como o são as etologias, uma disciplina cujo objeto privilegiado é o da comunicação. Obviamente que a atividade comunicativa é determinante para a configuração da República das Letras e suas línguas francas, seu sistema de correspondências e publicações e a atividade, em franco declínio, da verificação de procedimentos laboratoriais. No entanto, para além da comunicação pública que é característica da publicação de resultados, as pesquisas em humanidades têm como ponto de partida a atividade comunicativa fazendo com que uma infindável cadeia pragmática e uma sucessão de círculos hermenêuticos (sujeitos determinando objetos determinando sujeitos determinando objetos...) faça parte de seus percalços epistemológicos. Dito de outra forma, não é sem enormes dificuldades que uma pesquisa em que é a própria vida vivida lhe serve de tema. Sua introdução no seio da pesquisa científica lhe oferece uma profundidade permanente garantida por um ponto de fuga afiançado pela presença, dimensão esta que sequer a introdução dos instrumentos de medição antropométrico e as pesquisas em genética conseguiram dirimir. Assim, antes de adentrarmos em alguns outros exemplos em que o poder se apresenta como enunciado nas tramas da descrição objetiva e da observação etnográfica - plano em que a chamada crítica pós-moderna se estabelece - convém explorar, ainda que brevemente, alguns dos itinerários possíveis pelos quais esta questão se estabelece. Para tal convém percorrer algumas questões postas por Clifford Geertz a respeito do problema da autoria em antropologia e alguns de seus desdobramentos.
                        A epígrafe de Local knowldge, livro de 1983 (1999) traz uma passagem do Sur le fils naturel de Denis Diderot em que o mesmo discute a emergência do gênero sério como instituição do drama burguês[1]. Este gênero teatral combinaria elementos da tragédia, se necessário, fazendo com que o herói entre em conflito com as virtudes e a estrutura do cosmos e a ordem das paixões sem no entanto excita-las; ao mesmo tempo, em uma mesma peça, o ridículo e o elenco da falhas humanas também dão as caras sem com isso ter como propósito fazer rir. Esta imersão do drama na vida comum é o gênero sério. Não seria surpresa dizer que, no final das contas, Clifford Geertz está dizendo que devemos encarar a bibliografia produzida pela antropologia, em grande parte sendo produção etnográfica,  como um gênero sério. Nem tragédia, nem comédia. Nem reflexão só-teórica, o que seria uma tragédia, nem a ingenuidade de que a empiria, que a pesquisa de campo, resolveria todos os problemas do pesquisador, o que é cômico ainda que raramente seja algo engraçado. No limite, é na elaboração da cena entre o estar lá da pesquisa de campo e do estar aqui da elaboração daquilo que um antropólogo efetivamente faz - he writes down[2] como etnógrafo e write up como membro de sua comunidade científica (Geertz, 1973:19-20). A afirmação de que antes de mais nada o antropólogo escreve - e só - teve um efeito similar ao de um outro elemento teatral, no caso, da aparente surpresa de M. Jourdain, o burguês fidalgo de Molière, de que Há mais de quarenta anos que faço prosa sem o saber! Fico-lhe muitíssimo agradecido por me haver ensinado isso, diz o mesmo Jourdain ao Mestre de Filosofia para logo em seguida ditar suas intenções para uma carta de amor para a Bela Marquesa, para quem quer dizer que seus olhos me fazem morrer de amor, mas escrito de outro jeito, de modo galante, com elegância. O diálogo com o Mestre da Filosofia é cheio de ensinamentos, especialmente com relação àqueles que Jourdain já sabia sem tê-los estudado.
                        No entanto, esta comédia de costumes não acontece por mero capricho ou por simples despreparo. A etnografia como gênero sério reflete uma mudança nas relações de força e poder que fazem com que a tranquilidade com que pesquisadores como Malinowski, Evans-Pritchard, Lévi-Strauss e Ruth Benedict escreveram não seja mais possível. Isto se dá porque a relação entre quem escreve e quem lê, a função autor e a recepção mudou drasticamente, oferecendo ao pesquisador embaraços que seus antecessores jamais sonharam que teriam. Especialmente porque não foram poucos os que apostaram as fichas na extinção das populações que por ventura tivessem estudado. O contexto moral do ato etnográfico não é mais o mesmo assim como não são os mesmos os compromissos assumidos pela pesquisa de campo. O pressuposto da alteridade como afastamento geográfico-linguístico-tecnológico se desfez fazendo com que então viessem a se manifestar das mais diversas formas.
               Nada do esfacelamento da distância logística e infra-estrutural acaba necessariamente com o conteúdo de determinadas afirmações, métodos e descrições produzidas nas monografias consideradas clássicas - lembrando que salvo raras exceções, a lista é bastante polêmica[3]. Ao mesmo tempo este novo contexto moral não faz com que monografias antigas tornem-se obsoletas ou simplesmente rejeitáveis por se utilizar de expedientes que a média dos pesquisadores não consideraria adequada - inadequação que perpassa os métodos de pesquisa de campo, o vocabulário utilizado e mesmo a anuência daqueles que figuram como personagens da prosa etnográfica e seus diversos modelos; implícitos e explícitos.

                        "Essa confusão entre objeto e público, como se Gibbson de repente se descobrisse com um público leitor romano, ou se M.Homais publicasse ensaios sobre "A descrição da vida provinciana em Madame Bovary" em La Revue des Deux Mondes, deixa os antropólogos contemporâneos numa certa insegurança quanto ao objetivo da retórica. Quem deve ser convencido hoje em dia: os africanistas ou os africanos? Os americanistas ou os índios norte-americanos? Os nipologistas ou os japoneses? E convencidos de quê: da exatidão dos fatos? Do alcance teórico? Da apreensão imaginativa? Da profundeza moral? É bem fácil responder "Todas as alternativas acima", porém não é fácil produzir um texto que assim o faça."(Geertz, 2002:174).

                        Sem dúvida que a reunião desses fatores põe em relevo algo muito importante que é a alteração do público das monografias escritas por antropólogos e, assim, da mudança das estratégias, recursos e limites de afirmação de suas pesquisas. É nesse sentido que o gênero sério é lido como blurred genres, ou gêneros literários borrados. Porque a banca de avaliação não é mais somente, e por vezes não é necessariamente, a leitora daquilo que se escreve assim como os pares não são necessariamente os principais receptores de um artigo. Uma vez que públicos que outrora estavam afastados se aproximam com força e velocidade, é razoável intuir que o mesmo se dê com os métodos de registro e os meios de reflexão pelos quais a pesquisa produz seus artefatos. No final das contas a produção etnográfica, especialmente no que tange a relação entre o antropólogo e seu público, é compreendida como um processo descritível como interacionismo simbólico em que ágora e theatron parecem ser fundamentalmente indistintos - o que é tão sugestivo quanto suspeito vindo da parte de alguém que escreveu sobre o Estado-teatro balinês (1991)[4].
                        Convém compreender no entanto que esta sugestão, a de que ágora e teatro margeiam a indistinção, é uma proposição irônica, ao invés de cínica. Afinal, os riscos de estar entre lá e cá, afirma Geertz (2002), valem a pena. Ainda que seja possível questionar severamente se voltar para cá é o melhor desdobramento para a prosa etnográfica, como o faz Eduardo Viveiros de Castro, por exemplo; ou mesmo convém voltar a passagem supracitada e perguntar, sem vacilar, quem são os antropólogos contemporâneos da afirmação de Geertz, coisa que o fazem Johannes Fabian e Roy Wagner; ainda que tudo isto esteja em questão, a problematização da figura ou da função autoral não é simplesmente irrelevante. Mas para isso, estamos desde já avisados, a segurança da etnografia como gênero literário/editorial/científico não está garantida porque nosso público nos espreita logo ali, na sala de aula, batendo na nossa porta na permanente margem incômoda da presença que até não muito tempo era a arma exclusiva do pesquisador.


Balinese Cockfight, Alred Palmer (1949)



[1] "Pergunto-me sobre qual gênero é esta peça. É do gênero cômico? ainda que não diga nada de engraçado. É do gênero trágico? o terror, a comiseração e as outras grandes paixões não são absolutamente excitadas. No entanto, há o interesse que persistirá sem o ridículo que faça rir, sem o frêmito causado pelo perigo, em cada composição dramática onde o assunto seja importante, onde o poeta tomará o tom apropriado para as questões mais sérias, e onde a ação se desenrola pela perplexidade e pela trama. Ora, parece-me que tais ações, sendo as mais comuns à vida, o gênero que lhes terá por objeto deve ser o mais útil e extenso, que chamarei de gênero sério."
[2] Um dos exemplos mais formidáveis que conheço de write it down, isto é, de registrar no papel se encontra no anexos mitológico da etnografia de Pedro Agostinho sobre o ritual alto-xinguano do kwarìp (1974). Trata-se do mito que narra a rixa dos irmãos Kanaratì e Kanarawarì. Kanarawarì, que cagava perto do rio, ouviu Kanaratì arrancar uma flor de moitse'e(n) e a comparou com a 'aquela coisa' da esposa de seu irmão. Kanarawarì ouviu a comparação indecorosa, pegou um exemplar da flor e levou-a para a esposa a fim de verificar a informação que, por fim, se confirmou. Por causa disso Kanarawarì passa os dias seguintes colocando seu irmãos nas mais difíceis provações sem nunca revelar suas intenções, que seriam concretizadas não fosse a intervenção, também diária do avô. Em uma das provações Kanaratì sobe até o ninho de um gavião, onde ficou por quatro dias: "Aí o Irìvu [urubu] veio, veio, veio, chegou perto dele e disse: "Oi, você tá aí? Eu soube que seu irmão está sempre com raiva de você." Era só um urubu, velho, mulher. Desceu e parou: "Espere aí um pouquinho, vou apanhar meu marido. Foi lá, trouxe sal, pimenta, água para eles beberem, para comerem ratos, os Urubus. Aí Kanaratì ficou chamando: "Por aqui, por aqui, por aqui". O urubu disse: "Ouço sempre dizer que seu irmão está com raiva de você". Aí o rapaz bebeu água, tomou banho e quando acabou, o Urubu comeu o rato podre; para comer o rato, tinha levado pimenta e sal. Aí disseram: "Agora você monta em cima da gente, não olha para baixo, nem se mexe, senão não volta mais. Você tem que ficar quieto".  Monto. "Não abra os olhos, feche bem fechados, senão você fica com medo". Foi devagar, foi devagar, até que chegou lá no céu. Aí entrou lá e ele desceu: "Espera aí. Tem de descer com calma." Porque o Urubu tinha esporão grande na asa, se espetava o rapaz, matava-o. (O esporão era do tamanho dessa caneta.)" (Agostinho, 1974:197-198, grifo meu)
[3] Em uma Reunião Equatoriana de Antropologia da qual participei em 2010 eu conversava com um estudante da Universidade Federal de Roraima, em Boa Vista. de quem não perguntei o nome. Após um Grupo de Trabalho que discutia a história da etnologia alemã com a s ausências de Erwin Frank e de Marco Antônio Gonçalves - o primeiro então falecido -, vim a conversar com um também aluno de pós-graduação. Enquanto eu fazia doutorado na Unicamp, ele fazia mestrado na UFRR. Enquanto eu era mineiro, ele era makuxi. Discutíamos a má formação que tínhamos no que tangia o domínio da bibliografia clássica e de como as aulas na graduação não conseguiam dar conta deste universo. Após concordarmos a respeito disso meu colega listou os nomes que nos faltavam enquanto eu pensava em Radcliffe-Brown, Edmund Leach, Maurice Leenhardt. Seus nomes eram Theodor Koch-Grünberg, Curt Unkel Nimuendaju, Max Schmidt. Nunca apresentei os nomes que eu tinha em mente e ainda não sei se fiz bem.
[4] Não é à toa que Works and lives  (Geertz, 2002) é dedicado a Kenneth Burke, uma das figuras maiores da tropologia norte-americana cujas reflexões sobre retórica e forma literária são muito pouco apreciadas pelo público brasileiro, gozando de somente uma tradução de 1979. Ainda assim, é interessante notar o desprezo local por um pesquisador tão dedicado à eloqüência literária como forma de condução do público leitor. No ensaio Psicologia e forma, ao introduzir longamente a cena em que Hamlet se confronta com o fantasma do pai, urdida e antecipada com enorme cuidado por William Shakespeare, Burke anota: "Demorei-me um pouco nesta cena porque ela ilustra de modo perfeito a relação entre psicologia e forma, e indica de maneira muito hábil como uma deve ser definida em termos da outra. Vale dizer, a psicologia, no caso, não é a psicologia do herói, mas a psicologia do público. E, por via dessa distinção, a forma seria a psicologia do público. Ou, vista de outro ângulo, a forma é a criação de um desejo ou anseio (appetite) na mente do ouvinte e a satisfação adequada desse anseio. Tal satisfação - tão complicado é o mecanismo humano - envolve, às vezes, um conjunto temporário de frustrações, mas, ao fim, essas frustrações demonstram ser, simplesmente, um tipo mais complexo de satisfação, e, além disso, servem para tornar mais intensa a satisfação do cumprimento (fullfilment). Se, numa obra de arte, o poeta diz algo, por exemplo, acerca de um encontro; se escreve de tal maneira que desejamos assistir a esse encontro, e depois, nos põe tal encontro diante dos olhos - isso é forma. Do mesmo passo, obviamente, é também a psicologia do público, porquanto envolve desejos e sua satisfação." (Burke, 1979:45) 


Bibliografia


AGOSTINHO, Pedro. Kwarìp: mito e ritual no Alto Xingu. E.P.U./EdUSP. São Paulo.1974.
BURKE, Kenneth. Teoria da forma literária. Cultrix. São Paulo.1979.

GEERTZ, Clifford. The interpretation of cultures. Basic Books. Nova York.                       1973.
_______________. Negara: o Estado teatro no século XIX. Bertrand                                   Brasil/Difel. Rio de Janeiro/Lisboa.1991 [1980].
________________O saber local: novos ensaios de antropologia                                       interpretativa. Vozes.             Petrópolis. [1983]1997.
________________Obras e vidas: o antropólogo como autor. UFRJ. Rio de                     Janeiro. [1988] 2002.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Oceania Perfeita


O sal não é sempre,
não vaza do mesmo jeito,
porque não é assim que ele
entra.
Indiferente.


http://paradiseishell.wordpress.com/2010/04/26/we-sweat-and-cry-salt-water-so-we-know-that-the-ocean-is-really-in-our-blood-teresia-teaiwa/





“We sweat and cry salt water, so we know that the ocean is really in our blood” Teresia Teaiwa


I have advanced the notion of a much enlarged world of Oceania that has emerged through the astounding mobility of Pacific peoples in the last fifty years (Hau’ofa 1993). Most of us are part of this mobility whether personally or through the movements of our relatives. This expanded Oceania is a world of social networks that criss-cross the ocean, all the way from Australia and New Zealand in the southwest, to the United States and Canada in the northeast. It is a world that we have created largely through our own efforts, and have kept vibrant, and independent of the Pacific island world of official diplomacy and neocolonial dependency. In portraying this new Oceania I wanted to raise, especially among our emerging generations, the kind of consciousness that would help free us from the prevailing, externally-generated definitions of our past, present and future.
I wish now to take this issue further by suggesting the development of a substantial regional identity that is anchored in our common inheritance of a very considerable portion of Earth’s largest body of water, the Pacific Ocean. The notion of an identity for our region is not new; and through much of the latter half of this century people have tried to instil a strong sense of belonging for the sake of sustained regional cooperation. So far these attempts have foundered on the reef of our diversity, on the requirements of international geopolitics, combined with assertions of narrow national self-interests on the part of our individual countries. I believe that a solid and effective regional identity can be forged and fostered. We have not been successful in our attempts so far because, while fishing for the elusive school of tuna, we have lost sight of the ocean that surrounds and sustains us.
A common identity that would help us act together for the advancement of our collective interests, including the protection of the ocean for the general good, is necessary for the quality of our survival in the so-called Pacific Century when important developments in the global economy will be concentrated in huge regions that encircle us. As individual, tiny countries created by colonial powers and acting alone, we could indeed ‘fall off the map’ or disappear into the black hole of a gigantic Pan-Pacific doughnut. Acting together as a region, for the interests of the region as a whole, and above those of our individual countries, we would enhance our chances of survival in the century that is already dawning upon us. Acting in unison for larger purposes and for the benefit of the wider community could help us to become more open-minded, idealistic, altruistic and generous, less self-absorbed and corrupt, in the conduct of our public affairs than we are today. In an age when our societies are preoccupied with the pursuit of material wealth, when the rampant market economy brings out unquenchable greed and amorality in us, it is necessary for our institutions of learning to develop corrective mechanisms if we are to retain our sense of humanity and of community.




An identity that is grounded on something so vast as the sea is, should exercise our minds and rekindle in us the spirit that sent our ancestors to explore the oceanic unknown and make it their home, our home.
I am not in any way suggesting cultural homogeneity for our region. Such a thing is neither possible nor desirable. Our diverse loyalties are much too strong to be erased by a regional identity and our diversity is necessary for the struggle against the homogenising forces of the global juggernaut. It is even more necessary for those of us who must focus on strengthening their ancestral cultures against seemingly overwhelming forces, to regain their lost sovereignty. This regional identity is supplementary to other identities that we already have, or will develop in the future, something that should serve to enrich our other selves.
A regional identity
The ideas for a regional identity that I express here have emerged from nearly twenty years of direct involvement with the University of the South Pacific (USP), an institution that caters for much of the tertiary education of the South Pacific islands region, and increasingly of countries north of the equator. Its size, its on-campus staff and student residential arrangements and its spread make the USP the premier hatchery for the regional identity. Nevertheless the sense of diversity there is much more palpable and tangible than that of a larger common identity. Not surprisingly students identify themselves more with their nationality, race and personal friendships across the cultural divide, than with a common Pacific Islander identity. Apart from primordial loyalties, students go to the university to obtain certificates for returning home to work for their respective countries. Ultimately they do not come to the USP in order to serve the region as such.

In the earliest stage of our interactions with the outside world, we were the South Sea paradise of noble savages living in harmony with a bountiful nature; we were simultaneously the lost and degraded souls to be pacified, Christianised, colonised and civilised. Then we became the South Pacific region of much importance for the security of Western interests in Asia. We were pampered by those whose real interests lay elsewhere, and those who conducted dangerous experiments on our islands. We have passed through that stage into the Pacific Islands Region of naked, neocolonial dependency. Our erstwhile suitors are now creating a new set of relationships along the rim of our ocean that excludes us totally. Had this been happening elsewhere, our exclusion would not have mattered much, however in this instance we are physically located at the centre of what is occurring. The development of APEC will affect our existence in fundamental ways whether we like it or not. We cannot afford to ignore our exclusion because what is involved here is our very survival.
The time has come for us to wake up to our modern history as a region. We cannot confront the issues of the Pacific Century individually as tiny countries, nor as the Pacific Islands Region of bogus independence. We must develop a stronger and genuinely independent regionalism than exists today. A new sense of the region that is our own creation, based on our perceptions of our realities, is necessary for our survival in the dawning era.
In the few instances when the region has stood united, we have been successful in achieving our common aims. It is of utmost significance for the strengthening of a regional identity to know that our region has achieved its greatest unity on threats to our common environment: the ocean. It should be noted that on these issues Australia and New Zealand often assumed the necessary leading role because of our common sharing of the ocean. It is on issues of this kind that the sense of a regional identity, of being Pacific Islanders, is felt most acutely. The movement toward a Nuclear Free and Independent Pacific, the protests against the wall-of-death driftnetting, against plans to dispose of nuclear waste in the ocean, the incineration of chemical weapons on Johnston Island, and the 1995 resumption of nuclear tests on Mururoa, and most ominously, the spectre of our atoll islands and low-lying coastal regions disappearing under the rising sea-level, are instances of a regional united front against threats to our environment. As these issues come to the fore only occasionally, and as success in protests has dissipated the immediate sense of threat, we have generally reverted to our normal state of disunity and the pursuit of national self-indulgence. The problems, especially of toxic waste disposal and destructive exploitation of ocean resources, still remain to haunt us. Nuclear powered ships and vessels carrying radioactive materials still ply the ocean; international business concerns are still looking for islands for the disposal of toxic industrial wastes; activities that contribute to the depletion of the ozone still continue; driftnetting has abated but not stopped, and the reefs of the Mururoa atoll may still crack and release radioactive materials. People who are concerned with these threats are trying hard to enlist region-wide support, but the level of their success is low as far as the general public is concerned. Witness the present region-wide silence while the plutonium laden Pacific Teal is about to sail or is already sailing through our territorial waters. There is, however, a trend in the region to move from mere protests to the stage of active protection of the environment. For this to succeed, regionalism has to be strengthened. No single country in the Pacific can, by itself, protect its own slice of the oceanic environment: the very nature of that environment prescribes regional effort. To develop the ocean resources sustainably, regional unity is also required.
A Pacific islands regional identity means a Pacific Islander identity. But what or who is a Pacific Islander? The issue should not arise if we consider Oceania as comprising human beings with a common heritage and commitment, rather than as members of diverse nationalities and races. Oceania refers to a world of people connected to each other. The term Pacific Islands Region refers to an official world of states and nationalities. John and Mary cannot just be Pacific Islanders; they must first be Ni Vanuatu, or Tuvaluan, or Samoan. For my part, anyone who has lived in our region and is committed to Oceania, is an Oceanian. This view opens up the possibility of expanding Oceania progressively to cover larger areas and more peoples than is possible under the term Pacific Islands Region. Under this formulation the concepts Pacific Islands Region and Pacific Islanders are as redundant as South Seas and South Sea Islanders. We have to search for appropriate names for common identities that are more accommodating, inclusive and flexible than what we have today.
The Ocean in Us by Epeli Hau’ofa
Art by Rosanna Raymond

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Dois poloneses soltos no mundo




Ando me dedicando aos trobriandeses. E um bocado. Não aos que, hoje, estariam reclamando sua posição geográfica aliada a alguma forma de identidade social, cultural, ontológica, etológica - ou simplesmente, sua sobrevivência econômica. É uma dedicação trobriandesa àquele que, de alguma forma inventou esse negócio canônico de dizer sobre os outros povos na forma de “juntos somos um” sistematicamente. O sistema, os massim das ilhas trobriand, os que fazem kula, as personagens de Bronislaw Kasper Malinowski, cânone da variação etnográfica do relato. Este sujeito faz, via de regra, um par imperfeito da prosa polonesa com Józef Teodor Nalecz Korzeniowski. Ambos migrados, envoltos na figuração mezzo britânica, mezzo alienígena das formas abruptas do mar, ruminaram um inglês lento e cuidadoso, que trabalha numa crescente própria à inconstância marinha, esta alma selvagem ou, no mínimo, pagã, o que dá no mesmo. Ou quase. Desconfio, porém, que as semelhanças cessem por aí. Afinal, entre marinheiros mercantes e matemáticos há um mar. E não necessariamente o pacífico. Explico.
Ainda que seja incontestavelmente mais conhecido como antropólogo, campo no qual de fato se destacou, Malinowski fora matemático, como os interessados bem sabem, e que num surto de mal-estares fortes, foi internado em hospital e, assim, dedicou-se ao livro infinito de James George Frazer, The Goulden Bough. Foi sua segunda febre, fazendo do mesmo Frazer prefacioador de sua obra maior. A despeito das viagens e territórios inóspitos, da profunda absorção da camaradagem entre viajantes que só tem a relação entre-si – ao menos até o primeiro assassinato, fuga ou ato de espionagem; e nisso, Malinowski é o espião; mas o ponto central é, a despeito de todas as semelhanças entre um e outro polonês, eu nunca sonharia com Korzienowski. Já com Malinowski...
Pois foi em um salão universitário que balbuciava à congresso científico, movimento e pessoas passando. E o sujeito estava lá, o espião da Coroa em plena Melanésia, no meio da sala. Reconheci pelos óculos, os mesmos estampados na capa da edição brasileira de Os argonautas do pacífico ocidental, ainda adornada pela curva oblíqua que sua cabeça fazia, acrescentada somente de restos brancos de cabelo e numerosas rugas e manchas de sol – quando não, quase melanomas. O terno azul marinho não combinava com a minha memória em preto e branco, típica de quem tem a memória mediada por cristais de prata muito velhos. Azul marinho, e uma camisa branca acompanhada por um sorriso franco, fácil e branco à prova do tempo. E, não sei como, nem porquê, veio falar comigo, o brasileiro, sobre sua última descoberta, que estava enveredando para uma nova frente, e que pensava que a etnologia americana era farta, fértil, e que estava muito entusiasmado com O índio no mundo dos brancos de Roberto Cardoso de Oliveira. Sorri feliz porque vi. Era a mesma edição que disponho em minha biblioteca e, como Malinowski, sempre pensei que ali tem algo a mais, a despeito da simplicidade do argumento. Taí o velho polaco que não me deixa mentir. Ali, tem.
Imagino que, se for um leitor atento, terá percebido que isso em nada tem a ver com os dois poloneses, que falta amarrar este pequeno vôo (na verdade um salto). Confesso, então, que Korzeniovski, também conhecido como Conrad, Joseph Conrad, era só um pretexto. Mas, convenhamos. É Joseph Conrad, é um baita pretexto. Ou então Malinowski é seu secret sharer que, a despeito de tudo e da possível semelhança, fugiu da mesma forma que veio: ilegal e nu.

sábado, 18 de setembro de 2010

Clássicos para a Juventude de Prima Antropologia

Da diferença entre franceses e ingleses, que pode ser sintetizada na relação entre Mauss e Malinowski. O primeiro, francês, leu tudo quanto há, inclusive o que o segundo escreveu; promoveu um esboço de uma teoria geral sistemático da explicação de um monte de coisas a partir das investigações do outro sujeito, o mesmo Malinowslki que o agradecera num livro sobre Crime e costume na sociedade primitiva a boa leitura. Agradecimento de amigo.

Malinowski, por sua vez, é polonês.