Estou seguindo os passos do Bioy por esses dias. Estou numa de pesquisar fantasmas e máquinas e pretendo fazê-lo pelos próximos 4 anos. Fui a Buenos Aires em setembro para apresentar meus primeiros resultados em um congresso de antropologia - cuja semelhança com El Congreso é mais do que gostaria de afirmar, cheio de representantes de todas as humanidades. Enfim, imaginei que viajando para lá caberia o esforço de ler minha primeira novela argentina em castellano, dado que só alguns contos sofreram essa sorte de assassinato. Li 'La invención de Morel'; caminhei muito pela Belgrano, de Mayo, Mario Bravo, Perón, Boedo, 9 de Julio. Assisti aos dias de passeata da repatriação dos corpos de soldados mortos na Guerra das Malvinas (mais de 30 anos), além de haver debatido os fantasmas segundo o kardecismo em plena Universidad de las Madres, que fazem circular os filhos desaparecidos em outra sorte de aparição.
Entendo que Bioy e Borges sejam amigos. Mas a comparação cessa aí, a da dependência de um diante do outro como sanguessuga e boi gordo. Borges é um escritor da arquitetônica de Buenos Aires - o que fica claro em Evaristo Carriego. É o homem das formas imortais, do sistema (o 'grundstaz' que conhecia como poucos), da persistência além da vontade, daquilo que perdura. É o engenheiro de obras do labirinto que, evidentemente, Buenos Aires é. Caminhar pelas ruas e deixar-se tentar pelas portas abertas - porra, quantas portas abertas! Bioy, por sua vez, é o escritor das forças de Puerto Madero, da assombração, na terra onde ninguém morre e que tem na figura do índio fantasma a última encarnação (?) do eterno retorno do filho morto; ou é com outra coisa Bioy Casares firma contrato ao descrever a invenção de Morel e em escrever 'O lado da sombra'? É com Bioy Casares que o urbanismo de Borges é povoado, assim como é em Macedónio que Deus existe e com Arlt que as coisas, por fim, têm graça - no sentido forte, encontram seu lugar preciso. Só achei que deveria registrar isto, para meu próprio bem.