segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Longo demais, não é haiku.


Não, já quase não, digo, não creio haver,
não muito mais. Houve de termos
sombras soltas por aí, mas lembro saber
que o sol se põe grosseiro ao sair aos
cotovelos. As folhas que se escorrem
aos montes não hão de fazer a falta que
o sol fará. O sol não há de me fazer
falta quando tudo for sombra e a cor
ausente. Será imperativo, sei obedecer,
e enrugar as peles dos dedos, mofar as
solas dos pés, deixar rasgar as dobras,
e seguir indiferente para enormidade
das galerias lotadas aonde circula a
polvorosa inchada. Os odores se calam
e o esgoto convida para entrar apagando
os rastros, criando crocodilos que
devoram a carne dos mais afoitos e
roubam o céu da boca de quem, por
descuido paterno, nunca aprendeu
a gritar. Sim, se chove, mas não é de
temperar a vida, mas de amolecer
o humor que se deixa cair no salto
suave, lento e sincronizado da
última folha. Perdido até que, e um novo
encontro nos sabores dos outros. As folhas
varridas, os carros de limpeza, os sacos
revolvendo as coisas de poeira e nojo,
embaralham o que, de fato nunca foi
de alguém, mas o grande mercado
das cores que são trocadas verão a verão.
E então, não. 

domingo, 26 de agosto de 2012

Promener pour la méthode: mode d'emploi et le cas de l'aventure


(este não é um texto apologético)

Jovem. O mundo é grande. E houve o dia em que falou sobre a vida, a mesma que, à forma dos metrôs distribuídos pela cidade e que serviram de mote para o diagnóstico de que a população havia perdido seu lugar para o trânsito avassalador de coisas grandes feito trens, todos, com seu mode d’emploi. Pode não ser à toa, pode ser peculiar que a forma de entrar na vida seja o paraquedas que tem um sistema de anti-falhas que pode, todavia, falhar. Mas é significativo que Georges Perec tenha escolhido o anteparo de uma coisa para dizer que para entrar na vida é preciso saltar. Quando abrem-se as portas para o salto, é preciso fazer a escolha com relação à qual não há nenhuma razão para definir se é melhor ir ou não, e que a única coisa que discrimina o salto à paraquedas e o suicídio é a confiança numa coisa. E é preciso se lançar.
            No final das contas, Perec se assemelha a Claude Lévi-Strauss que, em uma entrevista a Bernard Pivot discrimina dois momentos da vida de antropólogo. Primeiro, como a paixão por aventuras participa, ainda que de forma subsidiária, de sua decisão de abandonar o ensino e o estudo da filosofia. Obviamente que tudo o que veio depois, em especial sua relação com a mitologia dos povos americanos terem se convertido em uma filosofia ameríndia, desmente um tanto a afirmação do abandono. Logo em seguida vemos que o que Lévi-Strauss tinha em mente com aventura se resumia, no mais, às atividades de camping postos num jogo delicado com sua imaginação ativada por um ou outro diário de exploração que, de uma forma geral já viviam no sistema da administração e do relato posto sob alguma forma de controle que os aproximaria da prosa etnográfica que o próprio Claude Lévi-Strauss viria a estabelecer, à forma dos exercícios de filologia. E então descobrimos que Lévi-Strauss, entre a aventura e a rotina, havia definido seus movimentos relativos a sentar e ler tudo o que fosse possível. A aventura da razão, diriam, e a qual, por maior que seja, me obrigo a colocar entre aspas. “L’aventure", cher professeur.
            Obviamente que entrar na vida é coisa diferente do suicídio, posto que no organograma das operações de trânsito no edifício enorme que parece ser o mundo, sua marca se encontra nas vias impróprias para a fuga. Suicídio é um método de entrada, e não de saída. Mas ao mesmo tempo, o paraquedas com relação ao qual Perec, em uma conversa com Jean Duvignaud, se diz diminuído. Não que o paraquedas o diminua em si, mas a situação que reclama a presença do paraquedas o diminui a saltar ou não. É no momento em que simplesmente il faut se lancer que precipita aquilo que se dá como intransferível. Il faut que je. É preciso que Eu, quando o impessoal desaparece e que, na decisão de saltar, tudo se resume na mera confiança posta em uma coisa posta às costas pesando grosseiros 15 quilos.
            Em Les choses, Perec mostra ser um tanto mais aventuroso quanto mais afeito ao tédio é. É neste romance em que ele mantém a regra de contar a vida de um casal típico dos anées 60 - cuja semelhança com o casal que logo sou me assusta um outro tanto. Reside no 14e Arrondissement, vive a vida sem salários, uma pequena fortuna experimental por vez reduzidas a jantares, passeios e viagens, o tipo de aventura com data e hora para acabar cuja descrição não se permite exceder o organograma da rotina. O cenário é exaustivo, descrito com a meticulosidade que um etnógrafo deveria ter, o mesmo etnógrafo cuja tarefa infinita Lévi-Strauss declara na mesma entrevista a Bernard Pivot, não ter qualquer vocação. Mostra-se que a aventura é outra coisa. Aos poucos, os objetos multiplicados ao indeterminado são restritos a conjuntos específicos, postos em séries, como as refeições feitas na capital ou no interior do país, os livros lidos, as lojas mais caras que fazem as vezes de museus de tudo aquilo que não se poderia possuir. Listas e mais listas de coisas que compõem a vida, de mais à mais, sutilmente decepcionante. Há mesmo que dizer, alienada. Mas o lance de dados que faz do salto um destempero controlado jogado às costas feito um paraquedas  que o próprio Perec comparou ao fascismo – il faut se lancer - faz do mesmo, aos poucos como todas as coisas colecionadas em uma biografia sem saltos quaisquer, alguma outra coisa. Trata-se, afinal de uma vida cujos sacrifícios está em adquirir coisas, esta a do casal. Coisas que lhe oferecem coisas e, por vezes, algo mais – e que isto pode crescer à forma francesa que aprendi, na animation. Obviamente que tudo depende de um parágrafo, ou menos.

            Ils continuaient leurs vie cahotante: elle correspondait à leur pente naturelle. Dans un monde plein d’imperfections, elle n’etait pas, ils s’en assuraient sans mal, las plus imparfaite. Ils vivaient au jour le jour; ils dépensaient en six heures ce qu’ils avaient mis trois jour à gagner; ils empruntaient souvent; ils mangeaient de frits infâmes, fumaient ensemble leur dernière cigarette, cherchaient parfois pendant deux heures un ticket de métro, portaient des chemises reformées, écoutaient des disques usés, voyageaient en stop, et restaient, encore assez fréquemment, cinq ou six semaines sans changer de draps. Ils n’étaient pas loin de penser que, somme toute, cette vie avait son charme.

            É quando, ao invés de Eu saltar de paraquedas,  salta-Se nos paraquedas, no prazer do sofá. E tudo isso me lembra um poema de Charles Beaudelaire - um dos dois que não me saem da cabeça. 

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Nous, les européenes.

Tantas histórias,
e viragens
mais o que tenho contado, caso pensado,
sobre a França
está nos livros. Mesmo quando alguém me diz.
O que é engraçado, porque, pelo visto,
e pelo lido,
mal saí de casa.
Leitura cara, essa.

O resto é muito interessante.