segunda-feira, 26 de julho de 2010

Granada, cegueira y dolor: segueira

Fui-me e voltei-me para quem hora e vez veio sentar-se ao meu lado, ainda que com dois ou três corpos de distância. Fui-me várias vezes ao voltar-me com a fronteira espinhosa, farpada mesmo que se armava nos lados de fora e ao voltar-me, seguia adiante. E isso é coisa sintomática, voltar-se para seguir. É forma precisa de o caminho virar do avesso, fazer das peles o intestino e por as fezes adornando a face aguda que contorna a nova boca da carne repuxada. É feio de falar e não dispões de muita visibilidade. Nem grotesco parece ser, sendo muito mais o sinal claro de atropelamento. Mas é como ao ir, se vai por voltar-se para lá, para o lado, ainda que à frente. Voltei-me para Granada, por exemplo, ainda que estando por lá pela primeira vez. Nunca havia, nem se por hipótese, eleito qualquer direção para a qual punha meu rosto mirado de forma a refletir “volto meu rosto para Granada”. Quase não existia para mim, esta cidade cuja Al-hambra povoa muitos dos meus sonhos de arquitetura, que desenha muito claramente vários sentidos do poder sentido. Afinal, o que é fazer Al-hambra, erguer o Palácio Nazaríes e mais o ajuntamento de torres, pedra-a-desenho? Quanta gente em torno de tão pouca gente, figura máxima da aristocracia? E mais, como é possível que tenha voltado-me para Granada quando fora ainda a primeira vez?

* * *

Duas idéias ruins, antes e durante Granada. Ler a Crítica del dolor de Macedónio Fernandez e perceber que ser roubado não é exatamente isso, ou não necessariamente. Para tal não basta ter. Pode ser indispensável dispor à desapropriação. Num roubo alguém pode ceder. E aí seguem sua vida adulta uns 30Euros numa situação que, não fosse o crédito improvável de uma velha cega de um olho com galhinhos de alecrim-robusto... Bom, deveria ter advinhado que os primeiros 10Euros do montante não voltariam uma vez que amassados na mão direita que apertava aquela bolsinha decerto infame, vermelhosa e inadequada. Ninguém que amassa uma cédula está disposta a devolvê-la. Mas que não se assome à idéia de que eu perdi dinheiro assim, tão simplesmente – não foi somente ingenuidade. Repito. Não foi somente ingenuidade, assim como nenhuma idéia, revestida de sua persistência improvável é só uma idéia. Perder dinheiro é algo que todo viajante deve estar disposto a fazê-lo, ainda que não o tenha. Deve estar disposto ainda que diante de uma prática tão velha e cegueta quanto a eficácia quiromântica cujo efeito que promove, na pior das hipóteses, não é o medo. Ao menos, não o medo da cegueira ou da quiromântica. En Granada el medo fue Del Alrededor. Perder o dinheiro, só a raiva assume o controle de algo.O pior contudo, foi ouvir sua péssima leitura de minha vida amorosa e eu então não ter respondido como deveria, encarnando o esprit d´escalier. Não disse: mentirosa estúpida. Uma loira, uma morena, ambas altas, um amor tórrido, e sequer uma palavra sobre uma certa nissei casada comigo há doze anos – me narrou como um moleque querendo foder na Espanha. Nada mais decepcionante que a decepção mística.
Mentirosa estúpida. Parece que fiquei doente só para conhecê-la, passei na febre uma sorte de crítica del dolor.

2 comentários:

Michelle Siqueira disse...

Que interessante!

Praticamente um diário de viagem, hã?!

Como foi mesmo que você "caiu" na da coroa?

Olha, você tem sorte, casado com uma nissei? É o tipo de beleza que me deixa de boca aberta, sério mesmo.

Boa a atualização deste espaço. Curiosamente, a imagem dos aviões em combate de um lado e os pássaros debandando do outro caíram muito bem.

E o fuso? Ô coisa cansativa, hein?

Um abraço,
Michelle

Refrator de Curvelo (na foto do perfilado, restos da reunião dos Menos que Um) disse...

Eu não caí na da coroa. Eu pulei na da coroa. Adoro ver no que essas coisas vão dar. Mas como dizem por aí, desde os anos 1800, aventura é prejuízo. Mas é aventura.

Quanto a minha sorte no casamento, respondo desaforado à gringa: YOU TELL ME?