segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
Da série "Aforismos de Merda"
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
Fantasmas assim...
Vi estas fotografias e escrevi, logo em seguida, para meu amigo AMPereira, professor da UFBA e biógrafo inédito de um turco-argentino por aí:
"Juro que ver essas fotos foi uma das experiências mais difíceis de "suspention of disbelief" que já tive. Não havia tantas cores, salvo quando mediadas por um pincel. Isto, caro AM, é algo que não pode ser. Assim, talvez sejam as fotos de fantasma mais genuínas que já vi na vida."
Só gostaria de compartilhar. Até porque, é lindo. Tarkovski certamente aprendeu por aí, assim, desse jeito. Atentem para o moleque sentado no gramado, sozinho, e o cachorro dormindo, que AM jura ser sua encarnação passada - até então o dado mais verossívil que disponho sobre estas fotografias.
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
O Critério da Maioria
Peguemos um caso de, digamos, benfeitoria majoritária. Um projeto de investimento que define diretrizes de consumo energético numa lógica de consumo irresponsável. Irresponsável porque investimentos são contabilizados como gastos – mas que não se conte o investimento do projeto como gasto; este sim, é investimento; na era das massas, o investimento que é investimento é chamado de “investimento estratégico” -, futuro é pensado como crescimento (olha a massa!) e população é entendida na lógica da maioria – razão idem. Daí aparece a noção de um investimento em prol da maioria, que para tal exige o sacrifício de uma minoria. E aqui eu peço, por favor, que não entendam minoria segundo o jargão universitário. Estou falando de partes maiores e menores de uma contagem de cabeças numa paisagem povoada por pessoas. Próximo passo: exige-se o sacrifício, cujo número é de 40 mil pessoas, em nome do bem das demais contadas em milhões. Daqui, entende-se um sistema sacrificial delicado, cuja lógica é a de trocar corpos por pepinos e, daí, oferecer à maioria sua própria substância: a maioria. Que, diga-se de passagem, não é ninguém. Explico-me.
Há na obra de Claude Lévi-Strauss (o da antropologia, e não o da calça) um esquema semiológico de redução do ente sacrificado disposto em ordem cósmica em que o mesmo apareça como substituto. Isso mesmo. Como substituto prototípico e só. Assim, pode-se colocar um pepino no lugar do destinado a morrer num ritual, desde que se ressalte a economia semiológica que defina a relação metafórica e faça a conexão precisa que demonstre em lugar de quem que o pepino está sendo sacrificado. Sei que parece absurdo, mas é pedagógico, tanto em O Pensamento Selvagem quanto, espero, aqui. O que entra em questão quando a ordem da maioria é posta é que é preciso desenhar com clareza a situação que relaciona a minoria a ser sacrificada, feito um pepino, em nome dos demais que, por causa de sua situação inconteste de maioria, deve permanecer com seu futuro inatingido – entenda-se futuro como crescimento. Da massa.
No caso de sucesso começa-se a entender quem é a maioria, e qual é seu corpo, nunca pronunciado. Ele é um corpo diretivo que tem suas prioridades definidas segundo esta mesma lógica sacrificial que permite que se opere a morte em massa, desde que em nome de algo maior. Maior. E porque deste jeito? Não sei. Mas gosto da história contada por um alemão chamado Simmel, de que o sacrifício é um adiamento da satisfação do desejo com vistas na consumação futura. Este mesmo alemão convertido em protestante narra uma historiazinha em que há etapas de concretização do sacrifício como formação da atividade simbólica que constitui sentido, digo, atividade simbólica. E aos poucos, a massa começa a aparecer de forma irreversível. Assim, se eu cometer penitência, a mesma passa a ter valor; mas no caso em que há pessoas demais e que eu existo somente como mais um, o sacrifício é essencialmente subjetivo, pessoal e intransferível, aniquilando o efeito do exemplo de comportamento para a ordem coletiva. Então, o que é objetivo, isto é, disposto à ordem comum é coisa que ultrapassa a ação pessoal e se transfere para sacrifícios envolventes, que conduzem aos adiamentos perigosos grupos de pessoas cada vez maiores. Se quatro pessoas afetam mil, 40 mil afetam milhões. Foi assim que este alemão cristão-novo aplaudiu o começo da Primeira Guerra. A sociedade de massas requer sacrifício de massas para gerar distinções históricas que permitam a narrrativa de um antes e de um depois sacrificial, como seria o caso judeu, ou mesmo da juventude alemã. Mas na lógica da maioria, quem é sacrificado é o pepino – isto é, outros milhares em nome dos existentes milhões. E daí percebemos que a maioria é sempre o futuro em nome do qual estamos para morrer, pois a maioria não tem corpo. Ela somente espera a morte do pepino.
Tá bom, eu sei. Nada disso faz sentido. É uma história absurda. Mas é nela é que se enquadra a lógica da ereção da usina de Belo Monte, essa coisa absurda desenhada para as bandas do Rio Xingu. Índio é pepino.
quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
Clichet que vale o que cobra
“Entraram, moçada.”
Por fim ele aparece ao lado dos amigos vitoriosos, sorvendo sua cerveja de 300 pratas a garrafa, diante dos olhos incrédulos dos mafiosos.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011
Folha nossa
Houve um tempo, e não exatamente long time ago, que um ambiente digital se dispôs à paródia. Lino (redator-chefe da revista Trip) e seu irmão, Mário (Mário?) montaram um site batizado com o nome Falha de São Paulo. Piada feita, a Folha de São Paulo moveu uma ação contra a Falha.
Mover uma ação contra a Falha, em geral, teria como pressuposto uma forma qualquer de disciplina do corpo visando a correção do espírito, ou mesmo algum tipo de dispositivo pedagógico que reproduz ou inventa uma forma de ordem. Lamentavelmente não é disso que se trata. Como o site se dispunha a fazer paródia, buliu de perto com a logomarca da Folha, que fez passar a piada adiante, tornando-se ela a própria Falha. Queixou-se na justiça de violação dos direitos sobre a marca. Os irmãos Bocchini fizeram sua defesa, com a qual estou fechado. Mas gostaria de ir além, pois há algo que me incomodou.
No processo, disponível no site http://desculpeanossafalha.com.br/ , a Falha, digo, a Folha reclama de danos morais e, não suficiente, recorre à seguinte locução: uso indevido do conteúdo do jornal. Em primeiro lugar, gostaria de saber quais danos morais, e a quem a paródia produziu e em que medida a Folha de São Paulo, ainda que sem parodiar - o que não é verdade; parodia - não faz o mesmo, exatamente porque o fator político da liberdade de expressão não é outro senão o de causar danos morais importantes. Afinal, publicar charges de políticos arranham sua imagem pública, assim como colunistas como Eliane Cantenhêdee Clóvis Rossi não economizam no verbo quando alguém lhe é desafeto ou alvo. E não deveriam, ainda que ache a leitura do que ambos escrevem um saco. A liberdade de expressão é importante porque lesa. E o papel da paródia numa democracia moderna passeia por aí. Tavinho sabe disso muito bem.
Mas o incômodo maior participa da noção de mau uso do conteúdo, pois aí teríamos um universo de considerações a fazer. Imagine-se produzindo uma pesquisa documental sobre as práticas de jornalismo no Brasil contemporâneo. Você escreve uma tese sobre comunicação, capital político e jornalismo e, a partir disto, mostra como a Folha de São Paulo alia ao lay out colorido a uma forma de oportunismo semiótico. Além disso, descobre como o oportunismo do veículo colaborou para se constituir uma relação de aparelhamento do espaço público e a demolição de projetos coletivos por via de ação sistemática contra iniciativas civis de pequeno e médio porte, apoiando a forma de centralização executiva que é marca do país, seu próprio desenho político-institucional. Você publica a tese na qual encontraríamos, além de outras coisas, a fotocópia de algumas páginas do jornal, com manchetes, etc. A Folha considera ser uma Falha do pesquisador chegar a tais conclusões e reclama ser este uso indevido do conteúdo, e não obstante traz em suas páginas a exata logomarca do diário.
Afinal de contas, o que é "uso indevido do conteúdo" de um jornal? E o que fazer, a quem devo processar pelo "uso indevido do conteúdo" estatístico, conceitual e jurídico que a Folha de São Paulo, e o jornalismo em geral pratica diariamente? Ainda faço isso, quero dizer, pego uma matéria "x" que mostra como um evento é determinado por duas variáveis - método utilizado à exaustão pelo jornalismo em geral -, o que estatisticamente é mais que impossível. É uma Falha. Parece-me mais que o erro dos Bocchini foi simplesmente o de terem deixado sua paródia por demais evidente.
Tavinho tem calos nos pés.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
Autorização
A redação do projeto de lei, já disponível no site da Câmara dos Deputados (http://www.camara.gov.br/sileg/integras/818871.pdf) sugere que 1) a mesma, como adendo à lei 10.753 opere em favor da livre circulação da produção intelectual nacional. Disso segue a afirmação de que 2), no caso de uma se livraria recusar em oferecer um determinado livro, deve reportar-se à CBL como exposto acima. Somado a isto, segue que 3) toda livraria será protegida pelo Poder Público, o que permitiria que o mesmo cometa este abuso de interferência muito semelhante à forma de distribuição de impressos do século XIX.
A idéia torpe de Andrada - ou de seu ghost writer, vá lá - é que as livrarias não são meros negócios, pois correspondem a uma atividade indispensável para a vida cultural nacional. Comentar esta verdadeira freada de bicicleta que é este projeto de lei permite que algumas coisas possam vir à baila. A primeira delas é a de uma legislação que não compreende o mercado livreiro em nenhum nível, principalmente no que diz respeito de ser, sim, um mercado. Paga-se impostos, e muitos, nesta atividade. Legislar uma atividade econômica alienando-a de sua própria atividade é patologia bacharel. Mas o mais bizarro é que além de serem contribuintes por comercializarem uma mercadoria depreciada no país, o ilustre deputado almeja que os livreiros do país se resignem a acumular às tarefas diárias o serviço de bibliotecário entendido como funcionário público, redigindo relatórios nos quais constem razões de recusa de uma mercadoria.
A disposição de obras produzidas no país é papel tanto de livrarias como de bibliotecas - cabendo a ressalva de que o tipo de política pública para o qual mira o deputado não é compatível com nenhuma das duas. Mas fundamentalmente, bibliotecas públicas que, em geral, cumprem esse papel mal e porcamente - como a maior parte das livrarias, por sinal. Afinal, sem a recusa de exemplares, colocar livros em qual espaço? Como constituir um acervo? Mesmo a Fundação Biblioteca Nacional tem um espaço tímido para as funções que promove - além do fato de eu não conhecer nenhuma biblioteca pública que não seja setorial, que não promova descarte de exemplares por economia de espaço; e ainda assim, todas muito maiores que as livrarias que conheço.
O projeto de lei ignora a difusão digital do livro - que oferece riscos ao comércio livreiro, como a queda de liquidez do mesmo; ignora a disparidade entre responsabilidades fiscais e exercício do comércio nas pequenas livrarias; a complexidade da distribuição de livros das editoras pequenas e das editoras universitárias, nunca contempladas com uma medida administrativa razoável que impactasse no preço do livro impresso - ainda que se entenda haver outras prioridades na gestão de infra-estrutura nacional.
A bem da verdade, o presente projeto de lei simplesmente ignora.
Seria muito mais interessante que os livreiros conhecessem e cultivassem interesse pelo material que vendem; que soubessem conversar; que soubessem receber e indicar. Que conhecessem seu ofício. Desejo o mesmo aos deputados, tremendamente deslocados, crianças soltas no mundo, bebês em tiroteio.
Segue daqui um recado amigo, ou no mínimo irônico:
Caro Bonifácio de Andrada;
Para desfilar suas frustrações como autor recusado, e de forma tal que faça da frustração uma atividade pública, escreva um blog, e não um projeto de lei. Just like me.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011
Durante a seca ou na iminência do inverno
Tudo isto escrito, exatamente desta forma, porque assisti a Le Concert e, supostamente o motor de ambas as histórias, é o mesmo: o peso que se carrega com a mudança.