quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Notas do calabouço: la méthode faite recherche et temps perdu

(os dias têm sido de relativa clausura no bunker. volume após volume, numa caixa de informação do tamanho da França, os nomes se desdobram em uma massa de alternativas. atrelado ao paralelo sutil da religião natural encarnada como religião civil, sigo os passos dos libelos republicanos que parecem manifestar com clareza e pedagogia os detalhes que constituem o novo fluxo da filosofia moral religiosa em tempos de terror. anoto. as notas, então)

VOLNEY, Constantin-François. 1979 Les ruines. Paris. Slatkine.


1860. Louis Vigne. Panorama de Palmyre. 





[NOTA: Les ruines porta consigo, nesta edição, um prefácio à edição de 1822 que começa com a busca do homem real desnudado que é, mais do que qualquer outra coisa, um acolhimento ligeiro da biografia de Volney que segue a profissão do materialismo que não somente está em questão, mas que põe a questão, da biografia como trajetória particular, isto é, da partícula. O primeiro movimento ao redor da figura de Volney é elaborar um desenho que seja flagrantemente contra-exemplar que servirá como figura para desenhar aquilo que para o prefaciador é a correlação entre a vida intelectual de um autor e a sua atividade carnal, carne machucada cujas cicatrizes determinam os sentimentos que o induziram a ser quem foi. Como que mirando para a lua num telescópio em que as manchas se transformam em crateras expostas à multiplicação violando a integridade moral celestina, o semblante de cada um dos citados é redigido como sua imperfeição maior – o que me faz perguntar sobre como induzir perfectibilidade para além do exemplo, o que me conduz ao aparelho simbólico erigido ao redor do cartesianismo tornado instituição, tema longo e descabido em uma nota como esta. Cito então uma passagem que prepara a entrada de Volney no prefácio que lhe é dedicado, mas seguramente já assombrado por ele mesmo. Segue seu biógrafo curto, Adolph Bossange:

            “L’étude de la vie des savans est digne de toute notre attention. Il est à la fois curieux et instructiff d’examiner comment ont suporte les malheurs de l avie, ceux qui ont enseigné les précepts d’une philosophie impassible. Leur histoire est un tisu de contradictions singulières. Le citoyen de Genève, qui consacre ses veilles au bonheur des enfans, abandone froidement les siens; enne mi dé claré des préjugés, il n’ose les braver; ce cœur sensible est sourd aux cris de la nature, et cet esprit fort est sans cesse tourmenté pas les fantômes bizarres de son imagination fièvreuse. Le plus grande génie de son siècle, Voltaire, qui porte des coups si auaudaciuex au despotisme, solicite et reçoit la clef de chambellan des mains de Frédéric. Newton, qui voue sa vie à la recherche de la vérité, commente l’Apocalypse. Le chancelier Bacon, le premier philosophe de l’Angleterre, fait un traité sur la justice, et la vend au plus offrant. On purrait multiplier les citations; ce ne seraient que de nouvelles preuves de l’imperfection de la nature de l’homme.” (Adolph Bossange, Préface  in Volney, 1979:III)
           
            Hermenêutica de ouvido: A obra literária é a ruína daquilo que fora a biografia do homem que a redigira. Esta marca de decadência, da matéria, vale dizer, serve de chave para Volney definir os traços que marcam os valores, a vida e a diversidade de civilizações que virá a tratar a partir de sua morte fazendo da história um registro da autópsia que determina, mais do que qualquer outra coisa, a cadeia de fatos que precipitam a morte do corpo estendido na mesa, no chão, ou empilhado numa paisagem moura. Ruínas, as mesmas que são discutidas por Paul Virilio em Guerra e Cinema, sobre a arquitetônica nazista que previa em suas edificações o amontoado futuro daquilo que vieram a erguer e que seria ocasionalmente derrubado em um ou outro bombardeio prevendo o que restaria do presente tornando o passado um projeto de futuro; da mesma forma que Walter Benjamim reclama sua herança para compor o complexo conceitual que Agamben, sob o signo da assinatura, vai definir ser o que resta. ]

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