[NOTAS DE PESQUISA DE ARQUIVO]
BLANCKAERT,
Claude. La perfectibilité, sous
conditions ? Éducation d’espèce, flexibilité d’organisation et echèlle
d’aptitude morale en anthropologie (1750-1820) in BINOCHE, Bertrand. 2004. L’homme pefectible. Seyssel. Champ Vallon. 2004
« Quels qu’en soient l’apport ou le témoignage
fondé, l’affiliation de ces autoeurs d’époques et de pays divers pose de
singuliers problèmes de traduction. Il n’est nullement prové que les
présupposés de base de leurs doctrines fuessent compatibles. Le remarque a été
faite par Ernst Behler à propos de la notion de « formation
progressive » de l’humanité (Bildung),
typique de l’idéalisme allemand. Elle vaudrait pareillement pour le mouvement
de l’empirisme anglais et écossais de l’époque moderne même si la composante
téléologique est ici beaucoup moins marquée. Bacon écrit
« proficience », là où nous lisons « progrès ». Ferguson
écrit « man is susceptible of improvement », la traduction française
restitue « l’homme est perfectible ». Toute pétition de principe mise
à part, les mots appartiennent à des univers linguistiques dont la sémantique
mérite un éclairage préalable. Comme, par ailleurs, le concept de « perfectibilité »
se transforme profondément ave sa diffusion dans la littérature générale et
scientifique d’expression française, il convient d’en repérer les usages réel
dans un contexte d’énoncés assez homogène. »(op.cit., 2004 :116)
O caldo conceitual sobre o qual Claude
Blanckaert faz menção define-se pela pauta daquilo que, à luz da história
natural deve ser considerado como a
exceção humana, isto é, como uma diferença que se funda na relação na
diversidade animal e que é, por sua vez, determinada por uma mesma ordem
natural e que, nesta mesma ordem produz cadeias, séries de relações,
diferenças constitutivas e modulações de hierarquia. Vale notar que o esquema é
bastante diferente do proposto para a questão da dignidade humana, tal como
posto por Pico della Mirandola, por exemplo, que não apostava na fixidez da
humanidade segundo seu aparelho corporal. Alquimista e humanista, Pico sugere
em sua Oratio de homni dignitate uma
relação transformativa do intelecto para com a constituição física do corpo variando
do mineral-vegetativo até o angelical, estágio que tem como antecâmara a
humanidade. Os pressupostos da perfectibilidade como horizonte não empregam
esta mobilidade e instabilidade que não inclui no esquema evolutivo de longa
duração, ou de tempo profundo, o tipo de descompasso entre indivíduo e espécie,
isto é, sobre a escala da relação na qual se dá a diferença perféctil que não ruma em direção à perfeição como tal. A
espécie ainda não é um problema que vem a ser na história natural. A
sobredeterminação morfológica e as propriedades do corpo enquanto matéria
estão, como esquema, subsumidos às propriedades do espírito. Assim, não há
exceção humana, mas uma qualidade própria da conduta, um plano em que se é
digno da humanidade que lhe fora conferida ao nascer – quando este for o caso.
A
mancha semântica que o conceito de perfecibilidade produz faz com que Claude Blanckaert se pergunte se a perfectibilidade é uma faculdade, um resultado ou
um processo. Obviamente que a questão, antes de ser respondida, mapeia a
variedade de aplicações do conceito que se presta, decididamente, a todos os
caminhos sugeridos culminando obviamente em resultados desiguais. Seguramente que a
mesma mancha se espraia para outros pontos, vindo a cobrir a perfectibilidade
de todos os animais que marca, em alguns aspectos, o sinal de oposição com
relação ao paradigma da Queda e o dilema da perfeição. Vale notar que o
elemento distintivo segue sendo, independente da vertente, a inteligência ou a capacidade intelectiva. É
aonde Cornélius de Pauw sugere haver um sistema geral de perfectibilidade em
que a inteligência é, não somente um traço distintivo de humanidade, um fator
de distinção na cadeia dos seres animados. Jacob von Mauvillon, em 1784 faz um
exercício comparativo similar à Lèttre sur les aveugles de Diderot ao procurar
definir, ao contrapor capacidades perceptivas diferentes, o estágio
humano efetivo e o real papel da intelecção no processo. Julien Offray de La Mettrie, em L’Homme
Machine produzira alguma antecipação ao questionar sobre a observação
relativa ao grau de sagacidade e perfectibilidade de um símio domesticado,
quando comparado a um surdo com a finalidade de distinguir as faculdades
naturais daquelas que se fazem por aquisição. Nisso:
« La parité spirituelle du sourd et du singe pourrait surprendre. Mais
tous deux sont des infirmes du signe de conventon et le langage reste, à n’en
pas douter, « le principal moyen de perfectibilité de l’espèce humaineª ».
Les frontiéres se brouillent. De l’animal à l’homme, concluait La Mettrie,
« la transition n’est pas violente ». Sur un mode libertin, Restif de
la Bretonne donnera à ce poncif une faveur nouvelle. Au jugement des voyageurs,
le singe aime les femmes. Il veut ainsi relever, par le croisement, sa race
déchue : « C’est donc un désir de perfectibilité, sans doute aveugle,
et parfaitement instinctal, que la nature a mis dans le singe, qui fait le fait
tendre à s’améliorer »º. //notaª : Nicolas Restiff de la Bretonne,
« Ma physique », cité par Patrick Graille, « Portrait
scientifique et littéraire de l’hybride au siècle des Lumières », in Faces of Monstruority in Eigheenth-Century
Thought, Andrew Curran, robert P. Maccubbin, David F. Morrill dir., Eighteenth
Century Life, vol. 21, nº 2, pp. 87-88, note 51// notaº N. Restif de la
Bretonne, La decouverte australe par un
homme-volant, oou le Dédale français, Leipzig, 1781, t. IV, p. 97. »
(op.cit. 2004 :121).
O fantasma dos híbridos assombra
a exceção humana, este é o dilema para o qual Blanckaert aponta e que, com
razão, traz uma série de desdobramentos importantes, especialmente se o que se
tem em mente é questionar sobre a forma política de organização que altera as
séries e as escalas de distinção entre seres que dão vazão a novas formas jurídicas
nas quais pessoas, físicas e jurídico-morais,
são reconhecidas – sabendo que novas pessoas precisarão ser produzidas,
como se vê no episódio do Comitê de Instrução Pública da Convenção do período
da Revolução Francesa. A aproximação anatômica e uma certa pulsão descrita na
chave da atração sexual faz com que vizinhanças próximas na cadeia dos seres
sejam fortemente tentadoras para a argumentação que movimente pessas para
dentro e fora da escala perféctil; símios e moçoilas. Restif de la Bretonne não duvida, por
exemplo, que na forma mais banal de existência, os símios sejam capazes de
perfectibilidades, raciocínio e ciência. Na comparação com os surdos não se
pratica a exclusão dos mesmos da cadeia
civilizatória, mas pratica-se a inclusão de uma série nova numa cadeia
outrora exclusiva. A educação dos homens deve participar do movimento dos
órgãos – o que é uma variação do que podemos depreender de Volney, que demanda
no alto do materialismo que professa a necessidade de coincidir as leis de
convenção com as leis naturais. As
raízes da organização humana enquanto espécie devem ser a base de sua
perfectibilidade, solo aonde pousa toda a instrumentação da pedagogia enquanto
tal. Sabe-se, por exemplo, qual sorte de resultados advém de um movimento que
alia evolução, monogenismo e perfectibilidade, o que encontramos de uma forma
geral na antropologia vitoriana. O amplexo da perfectibilidade é grande, ainda
que possa matar por sufocamento. A eugenia de Cabanis (op.cit.,2004 :123)
é somente o exemplo mais evidente.
Existe
algo mais na questão posta pela circulação do conceito ao redor da
perfectibilidade e sua posição característica relativa à linguagem como ente de
distinção definitiva. E não qualquer linguagem, mas aquela que permite com que
alguém seja cartesiano – in France, diz Geoffrey Sutton, to be cartesian is to be clever – que,
de uma maneira geral se corresponde com a requisição republicana de que todo
cidadão seja um legislador, o que aproxima a figura jurídica da afirmação
derradeira de Blanckaert, de que perfecitibilidade e filosofia são uma coisa só.
“Malgrés
ces restrictions, l’anthropologie inove sur deuz points fondamentaux qui
interrogent pareillement la place de l’homme dans la nature. Pour autant
qu’elle soit Science de l’espèce et non de l’individu, ele confirme avec Buffon
que la perfectibilité est bien une caractéristique différentielle de
l’humanité, qu’elle instaure sans autre partage une césure décisive entre
l’univers animal et le théâtre des operations humaines. C’est une institution
du genre humain. Et Buffon fut sans dute le premier à étayer cette afirmation
sur un corps de raisons nourri du comparatisme le plus exigeant. Le second
point concerne l’érosion de l’ideal humaniste et l’attention nouvelle porte au
facteur racial dont on attend, dans le mots de Condorcet, “et de nouveaux
moyens pour le perfectionnement de l’espèce humaine, et des lumières sur la
nature de sa perfectibilité”. Dans
les deux cas, la perfectibilité apparaît sous conditions, sans autre garantie
ontologique. Mais les deux thèmes se contredisent et méritent d’être
distingués. L’un porte, en effet, au crédti de l’education ce que l’autre
abandone au tribunal de la nature. » (op.cit. 2004 :125)
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Mimesis interespecífica por gesltalt em Buffon ;
«Certes,
il évoqua parfois une séquence logique, une « échelle » pour juger
des degrés des qualités intrinsèques de chaque animal, en prenant pour premier
terme la partie matérielle de l’homme, et plaçant succesivement les animaux à
différentes distances, selon qu’en effet ils en approchent ou s’en eloignent
davantage ». Mais leurs rapports de conformation ne dessinent pas une échelle
morale. Le singe le plus doué ne
participe ni de près ni de loin à l’excellence humaine : eût-il en
apparence les plus « beaux attributs humains », il n’en serait
« pas moins une bête » dénuée d’entendement. Buffon lui préferait
d’ailleurs le chien, le castor ou l’élephant, ce qui démentait tout rapport de
conformation. De plus, comme la « perfectibilité »se traduisait
principalement par la maîtrise des éléments physiques, Buffon estimait que par
leurs facultés d’adaptation et l’étendue de leur pouvoir prédateur, es oiseaux
« doivent être, après l’homme, placés au premier rang ». La «chaîne
du grand ordre des êtres » s’avère opportuniste. Les oiseaux dominent les
quadrupèdes et, selon l’enchaînement des prérogatives, « nous le
verrons »confèsse Buffon, « plus près de nous que leur forme
extérieure ne paroît l’indiquer. » (op.cit. 2004 :135). Todas as
citações de Buffon são orundas de « Le perroquet » e de
« Discours sur la nature des animaux ». Vale notar que paroît ressoa, à maneira do papagaio, em
parrot em inglês.
[NOTA : o desfecho do artigo de
do artigo de Claude Blanckeart avalia o legado de Buffon segundo os ecos que a
obra produziu, apontando para um paradoxo intrínseco do conceito de perfectibilidade. Ainda que esteja
diretamente comprometido com o humanismo iluminista, isto é, que se permite
depôr a favor de uma natureza humana comum que contitui um grau zero – e talvez
aí tenhamos o problema com todos os graus zero, de humanidade e de escritura,
para citar dois exemplos famosos - , a propriedade de uma finalidade sem fim
que é própria ao conceito cria um ambiente complexo para produzir distinções no
seio de sua própria definição, pois a perfectibilidade,
assim como a ação revolucionária (vide Homo Aequalis, de Louis Dumont) depende de um impulso que tensiona o
individual e o coletivo – o indivíduo e a espécie, no caso, – que justifica a ênfase
republicana francesa do XIX no conceito de organização
da sociedade que, sendo uma variação primitiva de planificação da economia, povoa toda sorte de análises da
antropologia social moderna. Aqui, a pergunta que parece obrigatória, e é a
mesma que um Kant se faz nas proposições de Uma
idéia de história universal é saber se a perfectibilidade é encarnada num ou
noutro pólo da relação, isto é, no individual ou no coletivo. A resposta
kantiana é taxativa ao dizer que o progresso é uma estância atingida pela
espécie, promovendo um ideal pedagógico da instituição do Iluminismo como uma
realização do espírito humano que tem como contribuintes expressos os indivíduos
de vulto e as invenções instituintes. Contudo, mesmo neste plano a diferença se
impõe, no que diz respeito às instituições tomadas por um ponto de vista
comparativo que, vale dizer, tem sua matriz teórica na anatomia e na
cosmografia. Assim, quais as razões que diferenciam os bosquímanos de um
parisiense no seio da própria espécie ? O que é de fato diferente
nesta diferença ? Mas o que mais chama a atenção para este comentário,
para além do tratamento dado ao conjunto grotesco chamado resto da
humanidade, para me valer da metáfora trite e rica de Volney para entender
o ponto de vista moderno sobre a diversidade de antigos que se espalham por
todos os cantos, é que a diferença não é relativa a quem é mais perfeito, mas
sim qual raça, ou quais as condições para que alguém seja mais perfectível. Daí o século XX, suas
crianças e a vantagem que um jogador de Playstation teria sobre o cérebro
onipresente de Isaac Newton segundo uma certa piada vigente.]
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