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Palmira.
Berlin. Paris. Não importa grande coisa se o que resta, quando resta são
ruínas. A Queda da Bastilha deixou, além de parcos tijolos escondidos por vigas
que ergueram a Ópera erguida sobre uma estação de metrô, uma história símbolo
da tomada de poder popular que abre os trabalhos da Revolução Francesa. Berlin,
ensina Paul Virilio em Guerra e Cinema,
fora reformada pela arquitetura nazista para que, ao ser derrubada por
bombardeios dos Aliados contra o Eixo viesse a contar uma certa história de
grandeza – uma arquitetura baseada na grandeza da decadência de Atenas e Roma.
Palmira guarda na voz fantasmática do gênio que visita o narrador de Les Ruines a biografia dos excessos e,
portanto, dos erros dietéticos de uma civilização vindo a contar a história de
todos os equívocos, passados e futuros, da política humana. A lição da história
é que ela é o trato daquilo que resta, o que sobra, em contornos documentais
cujo arranjo não é da outra ordem senão o da ficção – é da ordem do feito.
Fetiche. E que se entenda que em nada tem a ver com o fato, de que por ventura
seja verdade. Tem a ver com o que resta. No caso, resta pouco da salvação e sua
história, a heilgeschichte.
“Conhecemos a história de um autômato
construído de tal modo que podia responder a cada lance de um jogador de um
xadrez com um contralance, que lhe assegurava a vitória. Um fantoche vestido à
turca, com um narguilé na boca, sentava-se diante de um tabuleiro, coloca-o
numa grande mesa. Um sistema de espelhos criava a ilusão de que a mesa era
totalmente visível, em todos os seus pormenores. Na realidade, um anão corcunda
se escondia nela, um mestre no xadrez, que dirigia com cordéis a mão do
fantoche. Podemos imaginar uma contrapartida filosófica desse mecanismo. O
fantoche chamado “materialismo histórico” ganhará sempre. Ele pode enfrentar
qualquer desafio, desde que tome a seu serviço a teologia. Hoje, ela é
reconhecidamente pequena e feia e não ousa mostrar-se.” (Benjamim,
1996:222)[1]
Interessante
notar que Walter Benjamim advoga pela feiúra da teologia e, sendo um
comentarista partidário da ode ao feio de Charles Beaudelaire, acaba por tecer
o seu elogio. O comentário à frase de Rudolf Hermann Lotze, de que é admirável
que mesmo individualistas conseguimos não sentir inveja do futuro parece
retomar as bases do que Ernst Bloch chamará de princípio da esperança em que a salvação se desloca para algo mais
adiante, como felicidade ainda que adiada. A teologia insiste em não abrir mão
de coisas que a fazem falar baixo, no canto da sala. Ela, contudo, segue
sugerindo. Ela orienta. Resta saber se a história que não mais se dedica a
salvação em primeiro plano saberá ainda receber lições para a condução das
almas ou, pelo menos, para seguir ouvindo a sua voz e compreendê-la com
tristeza de quem compadece pela derrota. Acídia.
Compadecer
pela teologia não implica, contudo, em aderir à eclesiologia mas sim em tratar a
história do espírito como uma voz ainda viva, mesmo que soterrada pelo entulhamento
produzido tanto por ela, soerguida em ordens de catedrais, quanto pela delação
e violação dos espaços que outrora foram seus. A revolta armada do braço contra
a cabeça, diria a defesa do Corpus
Mysticum paulino, que faz com que os braços tenham ilusões cerebrais. A
delação, por sua vez, se entulha na forma de progresso, exatamente contra o qual é preciso dar atenção, uma vez
mais, aos rumores que reclamam pela voz dos anjos. Porque o progresso é o braço secular com delírios
de nobreza.
[1]
http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,vagao-fantasma-roda-sem-condutor-em-sao-roque,1139284,0.htm
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