segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Who am I, Jackie Chan? III - o cômico em comum e o liberal engraçadinho

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            However, to those who have been taught to regard essentialism as the gravest of intellectual sins it is necessary to explain that certain things are essential to that project – as indeed there are to “India” as a nation-state. To say this is not equivalent to say that the project (or “India”)  can never be changed; it is to say that each historical phenomenon is determined by the way it is constituted, that some of its constitutive elements are essential to its historical identity and some are not. It is like saying that the constitutive rules of a game can never be subverted or changed; it is merely to point what determines its essential historical identity, to imply that certain changes (though not others) will mean that the game is no longer the same game.”(Asad, 1993:18).

            West and the rest. É esta a clivagem para a qual Asad mais se dedica na contenda com Geertz. É o ponto e que concentra sua agressão exatamente por ser esta a fronteira criada pelo exercício da modernidade vindo a exprimir termos particulares desta relação, em particular como se constituem os modernos o resto do mundo como o exercício de seu negativo; os limites da extensão da contemporaneidade e o atraso evolutivo atualizado nas formas mais variadas; o privilégio do tempo futuro da gramática expressiva da noção de progresso. Ainda que completamente envolvida com a cisão os temas da pesquisa antropológica moderna a obriga a se aproximar demasiadamente da relação e seus protagonistas, esta gente que não produz e que não tem nada a acrescentar ao projeto da modernidade. Carrega consigo o fardo da inutilidade política, filosófica, teórica porque, enfim, toma a estranha decisão algo epistemológica de andar com as pessoas erradas e, de alguma forma, participar do seu jogo.

            Seria este o exercício proposto por Geertz, o de estudar na aldeia?

            Lembrando uma querela que persiste para além dos anos 1980, os temos de Writing Culture e a predicação da cultura via George Marcus e James Clifford vale retomar um lembrete. Antes de mais nada, o antropólogo é um autor. A antropologia, por determinação da condição humana ou mesmo por inspiração na Ciência Nova, é um artifício e a cultura um complexo ficcional. Produzir as thick descriptions  defendidas por Clifford Geertz é, desde o começo a definição de uma agenda de pesquisa que Asad problematiza. A antropologia como um código semiótico que, à forma dos demais, constituem a base da orientação humana como uma coisa feita. É ficção. A teoria da ação parte de um sujeito emancipado que, em Geertz não vai além de uma pragmática engaiolada ou, segundo a sua remissão à obra de Max Weber, suspensa numa teia de significados que é, por fim, a cultura. Ora, se a agência implica na extensão do ato e sua posse, o que pode um sujeito que só faz ficção? Seguramente, não muito mais do que antropologia, o que é algo como uma redução ao cômico:

            Anthropologists have not always been aware as they might be of this fact: that although culture exists in the trading post, the will fort, or the sheep run, anthropology exists in the book, the article, the lecture, the museum display, or, sometimes nowadays, in the film. To become aware of it is to realize that the line between mode of representation and substantive content is an undrawable in cultural analysis as it is in painting; and the fact in turn seems to threaten the objective status of anthropological knowledge by suggesting that its source is not social reality but scholarly artifice.” (Geertz, 1973:16)

            A redução ao cômico é um aspecto menos idiota do que parece, ou é perfeitamente idiota num certo sentido, digo, no sentido certo. Abre alas para a agência de um fator decisivo do esforço etnográfico de um certo culturalismo que recusa a narcose estética oferecida pelo ópio dos grandes modelos teóricos do tipo “the world according to me”. Franz Boas, em 1887 publica um elogio à geografia em favor de sua atividade eminentemente descritiva. Recuperar aqui este elogio por via de um desvio analítico-pragmático à Gilbert Ryle faz com que, de certa forma Geertz se alinhe com uma determinada questão ética imposta ao etnógrafo. Refunda a relação com ela operando no regime em que a mesma determinação das cores que da ótica passa pelos olhos de quem vê constitui o espaço de definição em que a antropologia e a condução da reflexão é feita junto aos amigos inúteis em um ambiente artificial, dado que ficcional. O caso é que cultura meramente ficcional provoca um pequeno distúrbio acerca da noção de alteridade, especialmente quando os amigos inúteis afirmam na primeira pessoa do plural que “não somos agentes da história, nem mesmo da nossa e o que fazemos não é ficção” recusando, por exemplo, a simetria por vezes perversa, por vezes redentora entre antropologia e conhecimento local.

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