ASAD, Talal.
Genealogies of religion: discipline and
reasons of power in Christianity
and Islam. Johns Hopkins Press. Baltimore and
London. 1993.
GEERTZ, Clifford. The interpretation of cultures.
Basic Books. Nova York.
1973.
4-
A discussão
a respeito da noção de agência aplicada ao problema da autoria, ou da
propriedade dos efeitos que em metafísica pode ser condicionado ao díptico
causa eficiente/design inteligente assume outras proporções quando a discussão
assume sua forma propriamente jurisdicional. Dito de outra forma, quando o que
está sob observação a mais escrupulosa é exatamente a determinação do poder
soberano, por um lado e de outro, a constituição do ato e do agente criminoso
que tomam à forma de um amplexo os extremos que ativam a identificação
codificada de agentes obsessores, por um lado que recheiam a bibliografia
produzida por Michel de Certeau, Robert Mandrou, Julio Caro Baroja, Keith
Thomas e Sarah Ferber. De outro lado delineia a forma do monopólio da
organização dos componentes psíquicos pela clínica e pelo direito cuja
historiografia de Michel Foucault, Marcel Gauchet, Ruth Harris, Jacques
Donzelot, Christian Phéline, Robert Darmon e os ensaios de Philipp Rieff e O Anti-Édipo de Deleuze e Guattari
descreveram à exaustão. Dito de outra forma, instituem de poder os agentes que
podem, os que não podem e os regimes de existência algo explorados pela
arqueologia foucaultiana e que tem um papel de destaque na composição da
modernidade histórica narrada a partir da linha da secularização. São
operadores de determinação ulterior das figuras presentes nos limites e no além
da jurisdição. É aí que a tensão entre Geertz e Asad atinge seu ápice e, penso
eu, sua maior relevância exatamente porque via Geertz nada parece existir com
maior grau de realidade dado que restrito ao terreno do simbólico – que é o que
existe no lugar de outra coisa numa forma de existência derivada próprias à
definição mais agressiva de semiótica da comunicação humana, e especificamente
humana como ele faz questão de enfatizar no ensaio sobre o impacto de conceito
de cultura no conceito de homem – segundo capítulo de The Interpretation of Culture.
De outra
forma, à maneira de Asad, o universo do discurso sempre sugere franjas e
bordas, ou um mais além da linguagem que define o empreendimento humano de
forma abrangente. Da antropologia também, como crítica e produtora de poder. A
comunicação humana reduzida a si-mesma parece ser condicionada por um projeto
de paz perpétua que acompanha esta forma mitigada de religião natural desde o
iluminismo escocês de David Hume, cuja concretude ou sua evidente falta forja a
principal razão de sua recusa e, no pacote, a recusa da ética implicada na
condução até o ponto em questão.
O itinerário
programado por Asad não é especificamente uma agenda contra-Geertz propriamente
dita, mas contra aquilo que o projeto de Geertz ironicamente representa dado
que demasiado dedicado na reprodução do confinamento e da defesa de uma
religião confinada (Asad, 1993:28), isto é, de uma atividade simbólica de
agência tutelada, o que é uma das especialidades do Estado moderno. Obviamente
que esta é uma forma grosseira de apresentar a antropologia de Clifford Geertz,
salvo se retomarmos a frase. Disse que Asad se indispõe contra aquilo que a
antropologia de Geertz representa, isto é, contrária à versão cômica dos
universais humanos que na forma de antropologia são registrados em livros,
filmes e museus e que, uma vez sumariados compõem um catálogo de traduções semióticas de textos culturais. Rigorosamente
a humanidade emerge como pura mediação com força de agência, é o objeto em
lugar de outro por excelência numa diluição homeopática da eucaristia.
Visivelmente é a contraproposta liberal para as instituições medievais que
eram, antes de mais nada, cristianismo público e não privado. E é esta
alteração que serve de evidência quanto aos limites da definição de religião
via Geertz:
“Let us, therefore, reduce our paradigm to a definition, for, although it
is notorious that definitions establish nothing, in themselves they do, If they
are carefully enough constructed, provide a useful orientation, or
reorientation, of thought, such that an extended unpacking of them can be an
effective way of developing and controlling a novel line of inquiry. They have
useful virtue of explicitness: they commit themselves in a way discursive
prose, which is this field especially, is always liable to substitute rhetoric
for argument, does not. Without further ado, then, a religion is:
(1)
a system of symbols which acts to (2) establish powerful, pervasive, and
long-lasting moods and motivations in men by (3) formulating conception of a
general order of existence and (4) clothing these conceptions with such an aura
of factuality that (5) the moods and motivations seen uniquely realistic.
a system of symbols which acts to…”(Geertz,
1973:90-91)
O
interessante é que Asad cita o elenco em tópicos sem mostrar ao seu leitor o
que é a definição de “definição” para Geertz como se os tópicos bastassem como
representativa de um universalismo qualquer sem se aproximar da postura de
Geertz como autor ou então, mais condizente com a crítica em questão, como
autoridade. Ao fazê-lo parece, contudo, perder o mais importante pois é quando
Geertz se mostra como uma espécie de comediógrafo liberal à forma de Harold
Bloom (Abaixo às verdades sagradas)
ou Richard Rorty (Contingência, ironia e
solidariedade), exímios problematizadores da definição de “definição”.
Afinal, se um símbolo é um objeto que se põe no lugar de outro, uma definição
se presta ao papel de premissa de um ato de comunicação cuja o ápice
performático é o da piada, da comédia. E deixar claras as premissas é uma
postura muito mais importante quanto a universalidade do conceito de religião
proposto do que a definição ela mesma. Até porque o religioso e o simbólico
coincidem nos termos da hermenêutica de Geertz, e Asad sabe disso. A esta altura,
ainda que motivações estejam fora da alçada do presente comentário, é mais
importante descobrir o que Asad que de Geertz mais do que o que Geertz de fato
produziu. E o que Asad demanda é disciplina.
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