Acordar
do sono que não veio ainda e revelar o sonho não sonhado, sabendo-se ser ausente
da justa medida e deixar seguir adiante exatamente aquilo que se quer conter. Mover os olhos para
os lados perseguindo o objeto impossível que só faz fugir desde a inauguração
do afeto. Agarrar pelos braços, não o tenro toque pleno do vôo, mas os braços
mesmos que não podem, não devem voar e, tampouco, impedir que o afeto siga,
doce e pleno, no vento que ele mesmo produz. E voa. E o que resta é uma escrita
sem figuração em que os lábios umedecem ao odor de outrem ao ler um bilhete
solto na brisa aonde, em redação honesta deixara como rastro uma simples
palavra, “beijo”. Nem despedida e nem promessa, o ato mesmo feito à forma em
que o gesto não trai a palavra e se faz assíntota fazendo emergir o momento em
que não se imagina mais nada, não se dorme, não se acorda. Meramente, acontece, ainda que não.
* * *
Em sua ocorrência
diária, toda história quotidiana necessita da linguagem em ato, do discurso e
da palavra, da mesma forma que uma história de amor é impensável sem ao menos
três palavras – tu, eu e nós. Em seus múltiplos correlatos, todo acontecimento
social repousa numa prestação preliminar ou concomitante de comunicações linguísticas
(langagières). Instituições e organizações – desde a mais simples associação, até a
ONU – aí têm seus recursos, sejam em forma oral, sejam em forma escrita.
(Reinhart Koselleck; L'Experience de l'histoire.)
2 comentários:
"Mover os olhos para os lados perseguindo o objeto impossível que só faz fugir desde a inauguração do afeto."
Muito bonito isso. Mesmo.
Tenho me esforçado, Ju. Fico feliz que não esteja errando tanto quanto de costume. Mais feliz ainda que tenha gostado.
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