“Hoje eu morro pela ação da forca. Estou
diante de vocês, agora, sem máscara que impeça que vejam meu sofrimento
derradeiro, pelo quê peço paciência. Logo mais, minha face será coberta para que
não se veja que sorte de espetáculo meu rosto fará diante de vocês. Abusado,
pode ofendê-los e então, antes que o momento de borrar a visagem com um capuz
fedorento, peço, repito, um tempo de sua atenção. Porque não quero declarar
inocência e tampouco pedir perdão, não pretendo chorar e tampouco negar, alegar
falta de clareza em algum momento ou passagem do processo. Seria ocioso,
desnecessário e não seria, de outra forma, honesto. Não sou inocente, ainda que
não seja culpado daquilo que irá me matar, e isto quero notar. Não quero pedir
perdão no momento derradeiro porque há muito troquei minha horas de sono pelas
preces, pela redação das cartas em que pedi perdão sem nunca realizar o pedido
de absolvição. Não tenho mais forças para chorar, o que se tornou um exercício
ocioso desde então, chegando mesmo a me fazer acreditar que seria incapaz de
produzir uma lágrima a mais. Não tenho mais fôlego para este último soluço. Não
tenho como negar aquilo que é fato, é evidente e nunca neguei, assim como
compreendo que o processo que me trouxe até aqui foi conduzido na mais profunda
normalidade. E talvez, por isso, pretendo dizer minhas últimas palavras
atravessando os seus olhos com os meus. São minhas últimas palavras, peço
atenção. Não se trata de eu merecer ou não a pena, e nem se o mundo ficará mais
leve, mais seguro com a minha ausência. A bem da verdade, essa alternativa é
decididamente peculiar e não há muito a dizer quanto a ingenuidade de uma
hipótese como esta. O caso é que farão comigo algo muito semelhante daquilo o
que fiz, o que parece ser uma compensação adequada, no que no final das contas
é de fato, uma soma, e não uma subtração. Serei mais um morto. O que quero
saber, e morro sem jamais ter ouvido algo a respeito, é se estou em vias de
morrer por ter sido condenado porque eu não tive forças de fazer a coisa certa
na hora certa, ou se falta a vocês esta força que me faltou no derradeiro
momento. Sei que agora é tarde. Nem espero que pensem sobre isso, a roda deve
girar. Mas não estou seguro quanto a quem está em julgamento no ato de minha
morte. Mas desconfio que aqui, amarrado a uma tábua prestes a morrer pelo
pescoço, acabei me transformando num alvo fácil, e isso decididamente fere até
mesmo minha condição animal. Isso não se faz.”
2 comentários:
show cara vc num teria de uma cadeira eletrica?
Confesso que não entendi a pergunta.
Postar um comentário