FRAZER, James George. The
golden bough: the magic art (2/13 vol.). Macmillan. 1990 [1913].
MAUSS, Marcel. Sociologia
e Antropologia. Cosac & Naify. 2003 [1950].
TAUSSIG, Michael. Mimesis
and alterity: a particular history of the senses. Routledge. Nova York. 1993.
4-
Michael Taussig é explícito ao enfatizar
que Hubert & Mauss redigiram notas críticas a respeito da teoria da magia
de Frazer como se fosse algo muito importante de se ressaltar. E é. Por uma ou
outra razão, seu esboço de uma teoria geral da magia, de Taussig, não pôde
ficar impávido diante da cena das páginas se desdobrando em páginas, notas e a
diferença enorme entre as relações fora de contexto de Frazer e aquelas de
Hubert & Mauss. Estar fora de contexto pode significar muitas coisas e,
obviamente, ler Frazer no contexto de sua citação é, ainda assim, a forma de
ler Frazer segundo Frazer, ele mesmo. Como imitação sem que com isso haja
qualquer nota mais substantiva que assuma ares de filologia, uma das
especialidades de Marcel Mauss. E que isto não seja lido como qualquer intenção
de imitar da parte dos pesquisadores franceses, como se a modalidade de
imitação à qual me refira dependesse disso. Talvez esta seja uma forma
impessoal pela qual seja possível ser contemporâneo; e que isto seja uma das
aproximações possíveis para o que pode ser dito a partir do conceito de cultura
– e a nacionalidade se transforma em nada mais, e nada menos, do que uma rima
em comum, segundo a máxima de Joseph Jacotot, ou simplesmente normas de
etiqueta que propiciem relações de troca.
Há, obviamente, vida antes de Frazer para
que ele seja considerado o presidente honorário, membro fundador de uma
linhagem. Mas, tal como vemos na abertura do ensaio de Hubert & Mauss,
Frazer especifica o problema da magia de forma a se transformar no original a
partir do qual os termos associados sejam elencados - eis um dos fundamentos da
atividade crítica filológica - numa linhagem de sucessão. Assim, Edward Burnett
Tylor é reconhecido como quem, em Primitive
Culture, estabeleceu a primeira teoria da magia a partir dos prolegômenos
da magia simpática. O detalhe é que sua teoria da magia não atingiu de forma
alguma a dimensão de uma teoria geral, isto é, que pudesse ser generalizada em
uma diversidade de campos e acontecimentos. Tylor se atém demasiadamente àquilo
que corresponde ao animismo, o que é
verdadeiramente um outro tema de discussão. O terceiro excluído está excluído,
mesmo quando existente.
“Com
Frazer e Lehman, chegamos a verdadeiras teorias. A teoria de Frazer, tal como
exposta na segunda edição de seu O ramo
de outro, é, para nós, a expressão mais clara de toda uma tradição para a
qual contribuíram, além de Tylor, sir Alfred Lyall, Jevons, Lang e também
Oldenberg. Mas como todos esses autores concordam, sob a divergência das
opiniões particulares, em fazer da magia uma espécie de ciência antes da
ciência, e como é esse o fundo da teoria de Frazer, é desta forma que nos
contentaremos em falar primeiramente. Para Frazer, são mágicas as práticas
destinadas a produzir efeitos pela aplicação das duas leis ditas de simpatia,
lei de similaridade e lei de contiguidade, que ele formula do seguinte modo: “O
semelhante produz o semelhante; as coisas que estiveram em contato, mas que já
não estão mais, continuam a agir umas sobre as outras como se o contato
persistisse”. Pode-se acrescentar como corolário: “A parte está para o todo
assim como a imagem para a coisa representada”. Desse modo, a definição
elaborada pela escola antropológica tende a absorver a magia na magia simpática.
As fórmulas de Frazer são muito categóricas a esse respeito; elas não permitem
nem hesitações, nem exceções: a simpatia é a característica necessária e
suficiente da magia; todos os ritos mágicos são simpáticos e todos os ritos
simpáticos são mágicos. (Mauss, 2002:50)
Que se entenda muito bem que não é com
relação à magia que Hubert & Mauss devem tecer comentários críticos a
respeito de Frazer. Tendo a dizer que teriam muito pouco, ou quase nada a
acrescentar ao que oferece, efetivamente, O
ramo de ouro. É com relação à religião que a tensão cresce, com relação à
qual a magia se transforma num conceito negativo, isto é, o ato que faz cessar
a conciliação religiosa o que faz de Frazer alguém que lhes atravessa o caminho.
Visto por este ângulo, a teoria da magia de Hubert & Mauss é derivação de
uma teoria da sociedade, o que não é nenhum escândalo lógico haja vista a
relação com outro ancestral, outro original que é Émile Durkheim, talvez o
verdadeiro original para a qualquer imitação impregnada nas formas do ensaio
sobre a magia. Isto porque, ao contrário do que encontramos em Frazer, o que
lemos na teoria geral da magia é o enquadramento homogêneo das fórmulas em
relações de causa e efeito que se impõe, antes de mais nada, na teoria de
sociedade que lhe é afim. Afinal, estamos no terreno do fato social das Regras do método sociológico no qual
todo fato social só pode ser antecedido por um outro fatos sociais; e que sendo
a magia um ato de tradição, e portanto social, só pode ser precedido por um
outro fato social, não necessariamente um ato mágico. Há aqui uma fortíssima
jurisdição em que a magia acontece somente sob licença, não podendo jamais ser
entregue ao plano do mero acontecimento.
Obviamente que o fiel da balança é o
conceito de religião. Ou de sociedade. Ou qualquer conceito que se pretenda ser
uma generalização e que, mesmo que no encontro marcado com selvagens ou outra
forma de sofismo – todos os selvagens são, ou bárbaros, ou sofistas ou
selvagens; nesta analogia há muitas conexões de tipo a parte está para o todo assim como a imagem está para a coisa
representada. E que não se entenda que por generalização o problema está
meramente em propriedades formais que trafegam como conceitos na história das
idéias. Isto porque a história das idéias não se move só, e tampouco somente no
tempo. Caminha no espaço, adentra em territórios inóspitos que atacam com a
força de enxames de mosquitos na pele branca, fundamentalmente como parte da
tripulação ou passageiro de barcos como os que avistados pelos três chocó perto
da ilha Encantamento. Metáforas são meios de transporte.
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